“Alteração da referenciação do Hospital de Ovar” (Opinião)

26 de Dezembro, 2022 Não Por A Voz de Esmoriz

Como tem vindo a público, está prevista a integração do Concelho de Ovar na área de abrangência da nova Unidade Local de Saúde Entre Douro e Vouga.

A Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS) estará, em articulação com as respectivas Comunidades Intermunicipais, a elaborar os planos de negócio para quatro novas Unidades Locais de Saúde (ULS), passando o Serviço Nacional de Saíde (SNS) a dispor de 12 unidades.

Na verdade, o nível de maturação desta questão poderá ser maior do que aquele que nós pensamos, uma vez que a própria Direção Executiva do SNS terá mesmo chegado a adiantar que já iniciou os trabalhos para a elaboração dos planos de negócio para as referidas quatro novas ULS, a saber: Guimarães, Aveiro, Entre o Douro e Vouga, e Leiria. 

O SNS dispõe atualmente de oito ULS: Matosinhos, Norte Alentejano, Guarda, Baixo Alentejo, Alto Minho, Castelo Branco, Nordeste e Litoral Alentejano – e com esta medida passará a dispor de 12 ULS.

Um processo que se prevê que esteja concluído no primeiro semestre do próximo ano.

A este propósito, também a Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro (CIRA) terá já manifestado o seu apoio e a sua congratulação com o anúncio da criação desta “nova” Unidade Local de Saúde, alegando que a mesma reveste especial “importância”, desde logo, porque irá culminar com a realização de  investimento de ampliação e qualificação do Hospital Infante D. Pedro, e com a possível integração futura do Centro Académico Clínico sob a liderança da Universidade de Aveiro, através da utilização de fundos comunitários do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), aproveitando a reprogramação que se encontra em curso, ou mesmo do Portugal 2030, que se encontra em fase final de negociação dos programas operacionais entre o Governo Português e a Comissão Europeia.

Em termos práticos, o que está aqui em causa será um plano de negócios que fará com que o Município de Ovar deixe de ter como referenciação o Hospital de São Sebastião, em Santa Maria da Feira, passando a ser o Hospital Infante D. Pedro, em Aveiro, a sua referência. 

Ou seja, por outras palavras, o acesso aos cuidados primários ou ao serviço de urgência hospitalar passarão a estar a 40 Km, ao invés de 4km.

Algo que, historicamente, os executivos municipais anteriores sempre se debateu para que o nosso Município nunca tivesse uma referenciação a uma distância de 40km!

E conseguiu-se isso através da figura de protocolos, em 2007, a correção daquilo que, administrativamente, está claramente inadequado. 

Sem exagero, qualquer análise serena demonstra que Ovar, em matéria de rede de emergência, não pode enquadrar-se em Aveiro, (que dista cerca de 45km) e Coimbra (que dista mais de 100km).

E não são razões de competência de respostas mas de serviço público que estão em análise.

Aliás, facilmente se entende haver muito mais a partilhar, mesmo extravasando a área da saúde, entre Ovar e Santa Maria da Feira ou Porto, do que entre Ovar e Castelo Branco ou Marinha Grande ou Guarda (curiosamente da mesma NUTII de Ovar). 

Impõe-se, por isso, uma lógica diferenciada, pelo menos em matéria de saúde e dadas as especificidades nas respostas, que não obedeça apenas a critérios administrativos, mas que tenha como prioridades a eficiência e qualidade dos serviços a prestar.

A título de exemplo, observe-se o caso de Castelo de Paiva, que, apesar de integrar a CIM do Tâmega e Sousa, enquadrou-se com a ULS do Entre Douro e Vouga, na AMP do Porto.

Se o objetivo desta medida, e a conivência do atual executivo municipal, de passar a referenciação do Hospital de Ovar de Santa Maria da Feira para Aveiro, é a otimização e integração de cuidados, a proximidade assistencial, a autonomia de gestão, o reforço dos cuidados de saúde primários e o foco nos utentes, a referenciação de Ovar terá então de ser mais próxima. 

O desempenho das Unidades Locais de Saúde (ULS) é avaliado ao nível do acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde, da qualidade dos seus serviços, da sua eficiência produtiva e do seu desempenho económico-financeiro.

Este acesso, proporcionado pelas ULS aos seus utentes, é analisado, ainda, numa vertente geográfica, a qual se desdobra nas dimensões da proximidade e da capacidade, e ainda numa vertente temporal.

Com a dimensão da proximidade considera-se a adequação da distribuição geográfica dos estabelecimentos à dos utentes, isto é, é considerada a distância e o tempo de viagem até aos referidos serviços. 

O que é expectável é que os utentes de uma ULS residam a uma distância considerada minimamente razoável. Ou seja, que a percentagem de habitantes que usufrui desse serviço assistencial resida até 15 minutos de viagem. Como todos já percebemos, o Hospital Infante D. Pedro não dista a 15 minutos de viagem do concelho de Ovar!

Acrescento, ainda, com base nas declarações do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Ovar na última Assembleia Municipal (ordinária, de 16 de dezembro) de que ainda nenhuma posição se tomou sobre esta matéria.

  • Mantemos a ligação à Feira, conforme se garantiu por meio do Protocolo entre a Câmara Municipal de Ovar e o Ministério da Saúde, em 2007?
  • Ou cedemos à nova posição da Comunidade Intermunicipal de Aveiro (CIRA)? De querer transferir a população de Ovar para o Hospital de Aveiro, com o propósito de aumentar o leque de utentes, e com isso justificar uma obra de melhoramento e ampliação do Hospital de Aveiro?

Qualquer ULS deve partir das pessoas para a organização administrativa e não sobrepor lógicas e interesses administrativos com laivos de corporativismo de má memória aos interesses das pessoas. 

Ora, as pessoas e munícipes de Ovar querem e têm direito a cuidados de saúde primários de qualidade, a serviços hospitalares eficientes, a uma rede de emergência que dê respostas atempadas. 

Qualquer referenciação a Aveiro ou Coimbra não garante estes requisitos. 

E uma referenciação a Santa Maria da Feira, deve ser trabalhada nas suas diferentes vertentes, implicando múltiplos agentes e instituições na participação e definição do que se pretende para o Município de Ovar.

A bem da nossa população, pelo acesso a um sistema de Saúde mais eficaz e eficiente, é preciso ir contra a posição da CIRA do qual o nosso Presidente da CMO é Vice-Presidente, e lutar para a manutenção da referenciação do Hospital de Ovar a Santa Maria da Feira.

Martim Guimarães da Costa, Arquiteto

Membro da Assembleia Municipal de Ovar