Artilheiros que levaram clubes “pequenos” (ou “médios”) à glória
21 de Fevereiro, 2021Introdução
A Premier League, a Bundesliga e a La Liga já coroaram campeões inesperados ao longo da sua história. Tendo em conta a paragem desportiva das competições de futebol do distrito de Aveiro, iremos apresentar agora uma reportagem sobre como alguns jogadores alavancaram os sonhos de equipas que, no início das suas temporadas, deveriam lutar pela manutenção ou por um posto no meio da tabela, embora acabassem por se sagrarem campeãs, carimbando de glória tais temporadas. Claro que o colectivo nessas formações foi determinante para anular a superioridade técnica dos clubes encarados como favoritos (e de orçamentos bem superiores), mas como não podemos destacar todos os jogadores, iremos aqui individualizar os goleadores que fizeram história por esses pequenos/médios clubes. Iremos centrarmo-nos naquelas três competições, analisando as três últimas décadas.
PREMIER LEAGUE/PRIMEIRA DIVISÃO INGLESA
Apesar das suas diferentes denominações ao longo do tempo, a Primeira Divisão Inglesa reivindica as suas origens em 1888. Desde então, cerca de 24 ou 25 clubes já se sagraram campeões nacionais, embora Manchester United (20 títulos) e Liverpool (19 títulos) sejam os mais laureados.
Como é evidente, não iremos abordar todos esses casos que possam ser considerados como vencedores surpreendentes, mas sim aqueles que são mais recentes, desde a década de 90 até aos dias de hoje.
Leeds United de Lee Chapman (1992)
No início da década de 1990, o Leeds United era uma equipa que impunha respeito. Na época de 1990/1991, ficariam em 4º lugar no Campeonato Inglês, embora quase a 20 pontos do Arsenal que se sagraria vencedor. A época de 1991/1992 começaria com o Leeds a apontar novamente baterias rumo ao objectivo de se qualificar para as competições europeias. A equipa contava com alguns jogadores de eleição: Gordon Strachan (guarda-redes escocês), Gary Speed (médio criativo galês) e Gary McAllister (médio escocês). No plantel, também havia lugar para o avançado francês Eric Cantona que, embora não sendo um dos jogadores mais influentes, começava a dar os primeiros sinais de que poderia vir a ser um caso sério no futebol internacional (como viria a comprovar no Manchester United e ao serviço da selecção gaulesa).
O principal artilheiro do Leeds United fora Lee Chapman que curiosamente nunca seria internacional A pela Inglaterra (embora tivesse sido chamado aos sub-21 e à equipa B). O avançado já tinha feito 21 golos em 1990/1991, mas na época 1991/1992 em que ajudou a levar o clube ao título, apontou 16 golos. Não era um grande tecnicista, mas era um finalizador eficiente que aparecia no sítio certo para fazer a diferença, tendo sido decisivo na época do título.
Blackburn Rovers de Alan Shearer (1995)
Outra equipa que costumava morder os calcanhares aos colossos ingleses no início da década de 90 era o Blackburn Rovers. Os “Riversiders” tinham sido os segundos classificados em 1993/1994, embora tivessem ficado a 8 pontos do campeão Manchester United. Em 1994/1995, o clube continuaria no pelotão da frente e, contra as expectativas, sagrar-se-ia campeão nacional muito graças aos esforços de atletas como Tim Flowers (guardião inglês), Graeme Le Saux (lateral polivalente que poderia também fazer posições no meio-campo), Colin Hendry (defesa internacional pela Escócia), Tim Sherwood (médio inglês), Chris Sutton (avançado inglês que mais tarde viria a ingressar no Celtic, onde também foi um elemento preponderante) e Alan Shearer (avançado inglês poderoso). Estes dois últimos jogadores ingleses, formaram uma dupla de ataque temível no Blackburn Rovers na época do título. O primeiro apontou 15 golos, mas o segundo fez… 34 golos!
Se Lee Chapman do Leeds United era sobretudo um bom finalizador, Alan Shearer estava uns bons níveis acima, tendo sido um dos melhores avançados da década de 90. Além de ser uma máquina de fazer golos, o avançado do Blackburn Rovers (e mais tarde do Newcastle United) perfumava os campos de futebol com a sua técnica e inteligência. De acordo com os analistas desportivos, foi um dos atacantes mais completos que passou na história da Premier League. Pela Selecção de Sua Majestade, faria 63 internacionalizações, tendo apontado 30 golos. Seria o melhor marcador do Euro 96 (com 5 golos) e terceiro classificado na atribuição da Bola de Ouro da FIFA nesse mesmo ano.
Leicester City de Jamie Vardy (2016)
Orientados pelo técnico italiano, Claudio Ranieri, que muitos julgavam estar em declínio de carreira, o Leicester City entrava na temporada de 2015/2016 com um objectivo taxativo – alcançar a manutenção na Premier League. Em 2014/2015, a equipa dos foxes tinha terminado num modesto 14º lugar, e esperava-se que a temporada seguinte não fugisse muito a estes pergaminhos. Mas a verdade é que o Leicester começou a ganhar jogos e a acumular confiança, mesmo não sendo uma equipa com um futebol de elevados recortes técnicos. No entanto, o colectivo era forte e coeso – Kasper Schmeichel (guarda-redes dinamarquês, filho do lendário Peter Schmeichel que fez história no Manchester United, e no final da carreira, no Sporting), Wes Morgan (central resiliente), N’Golo Kanté (médio francês possante que rumaria depois ao Chelsea) e Rihad Mahrez (extremo argelino que depois assinaria pelo Manchester City) ajudam a explicar muitos dos resultados positivos do Leicester, mas o seu artilheiro-mor era, sem dúvida, Jamie Vardy, um avançado que tinha sido contratado em 2012 a uma equipa da quinta divisão inglesa. Ao serviço do Leicester, Vardy começou a ser um elemento influente e, na época do título, fez 24 golos. Apesar de já ter sido cobiçado por grandes clubes europeus, Vardy continuaria leal aos foxes, mantendo registos similares época após época. Apesar de já ter 34 anos de idade, Vardy continua a ser bom no jogo aéreo, portador de um remate potente, e dotado de uma finalização apurada. Detém ainda um interessante sprint, mesmo para a idade que já tem. Até hoje, registou 27 internacionalizações pela selecção principal inglesa, apontando 6 golos.
E a sua contribuição para que o Leicester City fosse campeão em 2015/2016 não pode ser esquecida!
LA LIGA/LIGA BBVA
Nos últimos trinta anos da Liga Espanhola, Real Madrid e Barcelona têm reivindicado muitos dos campeonatos conquistados, embora sobrando sempre algum espaço para um Atlético de Madrid ou um Valência fazerem uma surpresa, embora tenhamos de considerar também estas como equipas de grande qualidade. Talvez o caso mais surpreendente tenha sido registado por um clube galego que esteve em alta na década de 90, e que foi premiado no último ano da mesma (1999-2000).
Deportivo de La Coruña de Roy Makaay (2000)
O Deportivo de La Coruña nunca tinha sido campeão espanhol. O clube da Galiza tinha começado a demonstrar alguns argumentos na década de 90. Em 1993/1994, a equipa que tinha em Bebeto (lendário avançado brasileiro) a principal referência de ataque poderia ter-se sagrado campeã, mas Djukic nos minutos de compensação do jogo da última jornada falharia um penalti diante do Valência (ficaria 0-0), caso tivesse concretizado, teria carimbado o primeiro triunfo histórico para o seu clube e evitado que o Barcelona fosse campeão. Foi um desgosto muito grande para os adeptos do Deportivo que chegavam à última jornada como líderes, mas que desperdiçaram da forma mais dramática o seu sonho, talvez julgando que nunca mais teriam uma oportunidade similar. No entanto, a história daria uma nova oportunidade ao clube galego e a desforra aconteceria seis anos depois, na época de 1999/2000, e o Deportivo de La Corunã superaria a equipa catalã e o Valência na luta pelo título, conquistando-o com 5 pontos de avanço. Nessa equipa, pontificavam Songo´o (guarda-redes internacional pelos Camarões), Mauro Silva (médio brasileiro), Djalminha (avançado brasileiro que fez 10 golos), Pauleta (lendário avançado português que, nesse campeonato, apontou 8 golos), Turu Flores (atacante móvel argentino) e… Roy Makaay. Este último, artilheiro holandês, tinha sido contratado ao Tenerife, tendo sido formado anteriormente no Vitesse. Na época de 1999/2000, Makaay esteve imparável – fez 22 golos em 36 jogos. Rápido, exímio a explorar as fragilidades das defesas, e que se isolava facilmente na cara dos guardiões adversários, Makaay não hesitava no momento da finalização. Os seus dotes goleadores continuariam bem evidentes quando foi contratado posteriormente pelo Bayern de Munique e mesmo quando terminou a carreira no Feyenoord. Somou 43 internacionalizações pela Holanda, embora só tenha feito 6 golos.
BUNDESLIGA
Na Bundesliga, houve também clubes que desafiaram a lógica, enfrentando potenciais favoritos como o Bayern de Munique (em certos períodos dos últimos tempos, foi quase um crónico campeão) e o Borussia de Dortmund (que chegou a dominar algumas temporadas). Na Bundesliga, o colectivo pragmático de algumas equipas permitiu que novas páginas de ouro fossem escritas na história da competição.
Kaiserslautern de Olaf Marschall (1998)
Após ter alcançado a subida à Bundesliga, o Kaiserslautern escolheu como seu técnico Otto Renhagel, sendo que este já tinha sido campeão pelo Werder Bremen em 1987/1988 e 1992/1993. Sempre utilizando um futebol mais táctico e pragmático, Otto Renhagel parecia estar destinado a feitos invulgares já que mais tarde orientaria a Selecção da Grécia que conquistaria o Euro 2004 que se realizou em Portugal.
O Kaiserslautern tinha no seu elenco jogadores como Andreas Reinke (guarda-redes alemão que começava demonstrar segurança entre os postes), Miroslav Kadlec (central internacional pela República Checa), Ciriaco Sforza (médio criativo suíço que viria, mais tarde, a passar pelo Bayern de Munique e pelo Inter de Milão), Jürgen Rische (avançado germânico que fez 11 golos nessa temporada), entre outros.
Também nesta equipa, e embora não fosse titular no onze base, começava a dar os primeiros passos Michael Ballack que mais tarde daria cartas no Bayer Leverkusen, Bayern de Munique e Chelsea.
Mas o grande artilheiro da equipa campeã de Otto Renhagel seria Olaf Marschall. Considerado imperial no jogo aéreo (fez muitos golos de cabeça) e com uma boa habilidade técnica, Olaf apontou 21 golos na edição da Bundesliga de 1997/1998. A excelente temporada que realizou ao serviço do Kaiserslautern, clube pelo qual se sagrou a campeão, motivou a sua convocatória para a Selecção da Mannschaft que viria a disputar o Mundial de 98. Ao longo da sua carreira, chegou a realizar 13 internalizações pelo seu país, tendo feito 3 golos.
Werder Bremen de Aílton (2004)
Em 2003/2004, o Werder Bremen, comandado por Thomas Schaaf, fez história ao conquistar o quarto campeonato da sua história no futebol alemão. A equipa encetou um trajecto interessante, praticando um futebol atractivo. O conjunto era constituído por alguns jogadores de renome: Andreas Reinke (guardião alemão que já tinha sido campeão pelo Kaiserslautern), Mladen Krstajić (central internacional sérvio), Umit Davala (defesa turco emprestado pelo Inter de Milão), Kristian Lisztes (médio internacional húngaro), Johan Micoud (médio criativo francês), Nelson Valdez (avançado paraguaio) e Ailton – avançado brasileiro que fez 28 golos naquela temporada. Este último apesar de nunca ter sido internacional pela selecção do Brasil e de ter passado por inúmeros clubes, fez talvez a sua melhor época em 2004, ajudando o Werder Bremen a superar o Bayern de Munique e a conquistar a Bundesliga.
Estugarda de Mario Gómez (2007)
O habitual favorito à vitória na Bundesliga, o Bayern de Munique tinha conquistado os campeonatos de 2004/2005 e 2005/2006 e muitos acreditavam que assim continuaria na época seguinte, contudo tal não se verificou. O Bayern realizaria uma temporada decepcionante, terminando na quarta posição.
O campeão seria o Estugarda, orientado por Armin Veh. A equipa contaria com alguns nomes sonantes: Fernando Meira (central internacional por Portugal), Ricardo Osório (lateral internacional mexicano), Pavel Pardo (médio possante mexicano), Sami Khedira (médio criativo germânico), Cacau (atacante móvel brasileiro, depois naturalizado alemão, que fez 13 golos) e… Mario Gómez – avançado germânico que apontou 14 golos, demonstrando possuir uma forte capacidade de remate e um bom cabeceamento. Viria a somar 78 internacionalizações pelo seu país, tendo rubricado 31 golos. Depois da sua experiência bem-sucedida no Estugarda, brilharia igualmente ao serviço do Bayern de Munique.
Wolfsburgo de Edin Dzeko (2009)
Apesar de um bom investimento no plantel, nunca se esperaria que o Wolfsburgo viesse a lutar pela conquista do primeiro título da sua história no decurso da época de 2008/2009. A equipa encontrava-se sob a batuta de Felix Magath, antiga lenda do Hamburgo que chegou a conquistar uma Taça dos Campeões Europeus na década de 80.
O Wolfsburgo superou a concorrência apertada de Bayern de Munique, Estugarda e Hertha de Berlin, vencendo a prova de forma inédita. Nessa equipa, existiam alguns jogadores de qualidade: Diego Benaglio (guardião internacional pela Suíça), Cristian Zaccardo (defesa italiano), Andrea Barzagli (central internacional pela Squadra Azurra) Ricardo Costa (central português), Josué (médio internacional brasileiro), Grafite (avançado brasileiro que fez 28 golos na temporada da Bundesliga) e Edin Dzeko (estrela do ataque, o bósnio rubricou 26 golos nesse campeonato, fez mais 10 golos nas restantes competições – taça alemã e competições europeias – o que o tornou num dos avançados mais letais a jogar na Bundesliga dessa temporada). Jogador portentoso e munido de uma grande força física, Dzeko marca golos de cabeça e também detém um remate forte e colocado. Depois de ter ajudado o Wolfsburgo a fazer história, o avançado goleador viria a fazer também estragos ao serviço do Manchester do City e ainda hoje faz a diferença no AS Roma.
Refira-se ainda que muitos outros craques brilharam em clubes que não eram propriamente colossos e que deixaram um legado determinante: Gabriel Batistuta (Fiorentina), Giafranco Zola (Parma), Enrico Chiesa (Sampdória e Parma), Francesco Totti (AS Roma) Matt Le Tissier (Southampton)…
No futebol português, também poderíamos citar o triunfo algo recente inesperado do Boavista FC em 2001, e outros jogadores que, mesmo sem alcançarem títulos de campeões nacionais, brilharam em equipas mais pequenas/médias do nosso campeonato: Yekini (Setúbal), Jimmy Hasselbaink (Campomaiorense e Boavista), Gaúcho (Estrela da Amadora), Karoglan (Braga), Fary (Beira-Mar), Peter Rufai (Farense) e muitos mais que poderiam ter potencial para chegar aos “Três Grandes” mas tal nunca viria a acontecer.
Créditos da Imagem de Destaque da Reportagem: Retirada da página Footchampion.com & Barclays Premier League – a entronização do Leicester City em 2016.
Fontes: Daily Mail, Marca, Sites oficiais da Premier League, Bundesliga e La Liga, Der Spiegel, Bild, Yorkshire Evening Post, Transfermarkt, Zerozero, Wikipédia.