“As alterações climáticas e a biodiversidade” (Opinião)
8 de Abril, 2021As emissões de gases com efeito de estufa (GEE) e os seus efeitos no aquecimento do planeta, têm aumentado de forma consistente desde a era pré-industrial, numa trajetória ascendente que em larga medida se deve à expansão demográfica e ao crescimento económico. À escala global, a energia é a principal fonte de emissões poluentes, seguida da floresta, da agricultura e do uso do solo, da indústria, e dos sectores dos transportes e da construção. Os efeitos das alterações do clima são conhecidos: uma menor produtividade dos ecossistemas e redução da disponibilidade de água e de alimentos; o movimento migratório imposto às comunidades mais vulneráveis; o agravamento da pobreza; o aumento de tempestades e outros eventos climáticos extremos, a alteração das correntes marinhas e, por consequência, dos padrões climáticos à escala local, o aumento do nível médio das águas do mar e os seus efeitos sobre a orla costeira.
As emissões de GEE têm também um enorme impacto na saúde e no bem-estar das populações humanas. Estima-se que o impacto global da doença e da morte prematura relacionada com a poluição ambiental é já três vezes superior ao da SIDA, tuberculose e malária combinadas. Mas o aumento das emissões de GEE que se continua a verificar apesar dos compromissos internacionais, poderá traduzir-se em impactos ainda mais graves, desencadeando o colapso dos ecossistemas do ártico, recifes de coral e floresta amazónica. Estas alterações são irreversíveis e podem pôr em causa a capacidade da natureza para continuar a prestar serviços essenciais, tais como a produção de alimento, a disponibilidade de água potável ou a fertilidade dos solos.
As alterações climáticas representam uma evidente ameaça à prosperidade social e económica global, e de forma geral à segurança no mundo, sendo que as respostas exigem cooperação e um compromisso efetivo entre todos os países. A prioridade internacional terá que passar pela redução dos combustíveis fósseis e por alternativas inteligentes, mobilizando a ciência, a tecnologia, a indústria, a inovação, e a sociedade em geral, em prol de um caminho ecológico e justo. Todos beneficiam com esta transição: a indústria, a economia, o emprego, o planeta e o ambiente.
Por forma a cumprir o acordo de Paris e os objetivos de descarbonização da economia mundial, impõe-se abdicar rapidamente da energia fóssil e evitar um aumento da temperatura global acima de 2ºC (1.5ºC seria a meta mais justa). Para tal, as emissões mundiais de CO2 terão de baixar de 40% a 70% até 2050 e chegar a zero até 2100 (IPCC). Estas metas são curtas e muito contestadas, impondo-se objetivos mais exigentes e a sua antecipação. É o fim anunciado e desejado dos combustíveis fósseis, de onde resultam a maior parte das emissões de CO2, mas vai ser necessário um maior empenho político global; é fundamental que os cidadãos continuem a exercer pressão e a exigir o cumprimento rigoroso das metas de descarbonização junto dos governos dos seus países. A Europa e os Estados Unidos anunciaram recentemente uma agenda de políticas e de investimento público estratégico que representa uma oportunidade para intensificar a transição ecológica, apoiando uma aposta consistente na transformação sistémica profunda da produção, consumo, e estilos de vida, respeitando os limites do planeta.
O mundo é cada vez mais governado em função da maximização do fluxo de contributos da natureza para acompanhar a crescente demanda de alimento, energia, madeira, com o comércio global a aumentar a separação geográfica entre a oferta e a procura. A maioria dos indicadores do estado da natureza, quer sejam monitorizados por cientistas naturais e sociais, quer por povos indígenas e comunidades locais, estão em declínio. Estes indicadores incluem o número e a dimensão populacional das espécies selvagens, o número de variedades locais de espécies domesticadas, a distinção de comunidades ecológicas, e a extensão e integridade de muitos ecossistemas terrestres e aquáticos. Como consequência, a capacidade da natureza para proporcionar benefícios também diminuiu, incluindo os processos ambientais subjacentes à saúde do homem e os contributos imateriais para a qualidade de vida humana.
Portugal dispõe de um plano para o combate às alterações climáticas, com orientação políticas e metas sectoriais de redução de emissões a desenvolver em conjunto com sectores como os transportes, a energia, a agricultura e a floresta. O país deverá reforçar a aposta nas energias renováveis, em especial a solar e a eólica, na mobilidade elétrica, na eficiência energética, na construção sustentável, na gestão da floresta, na inovação de práticas e opções agrícolas e florestais, nos planos de gestão da saúde em particular nas cidades, na prevenção das patologias diversas associadas ao clima, e na educação.
É urgente implementar a agenda política para a sustentabilidade que os cidadãos do mundo reclamam: uma aposta ousada e firme numa economia verde, circular e descarbonizada. Os cidadãos europeus estão mais conscientes do que nunca da crise ambiental e social. Eles exigem que os seus líderes percebam o momento crítico da história e que respondam à emergência climática e à crise da biodiversidade, construindo as soluções políticas e atuando em favor da paz, pelo bem-estar e pela justiça dos povos, e pela preservação de um planeta que acolhe uma extraordinária diversidade de formas de vida.
Helena Freitas
Professora da Universidade de Coimbra.
Cátedra Unesco em Biodiversidade e Conservação para o Desenvolvimento Sustentável