Capela da Penha, um dos mais belos templos da região
5 de Janeiro, 2021Em finais de 2019, a Comissão de Melhoramentos de Esmoriz, em parceria com a Universidade Sénior de Esmoriz, asseguraria a estreia do projecto “Nos Caminhos do Roteiro”. O objectivo passaria por divulgar mensalmente alguns dos ex-libris da cidade de Esmoriz que estão presentes no roteiro turístico publicado recentemente pela Comissão de Melhoramentos de Esmoriz. Cerca de 20 alunos da Universidade Sénior de Esmoriz puderam assistir à visita guiada então monitorizada por Pedro Henriques, licenciado em História.
A Capela da Nossa Senhora da Penha de França sita no lugar da Boavista, em Esmoriz, seria o primeiro edifício visitado.
A Lenda de Nossa Senhora da Penha de França
Em Espanha, mais concretamente na Província de Salamanca, existia uma serra muito alta e íngreme chamada Penha de França. Terá sido aí que por volta do ano de 1434, isto é, no século XV, um peregrino ou monge francês chamado Simão achou uma imagem sagrada de Nossa Senhora que há muito era procurada. No entanto, antes disso acontecer, Simão teve um sonho miraculoso onde lhe era incumbida a missão de procurar a dita imagem que estaria enterrada no topo de uma montanha. Durante cinco anos, esse peregrino andou à procura da serra e da imagem, escalando penhas íngremes até que teve uma nova visão divina e auxiliado por alguns populares, lá encontrou num lugar então chamado Penha de França a imagem de Nossa Senhora que tinha visto em sonho e que estaria perdida desde os tempos da Reconquista. Simão terá ficado com o apelido de Vela (Simão Vela) porque teria ouvido vozes divinas que o incentivavam a continuar a sua procura (“Simão, vela e não durma”).
Foi então aí que nasceu o culto em honra de Nossa Senhora da Penha de França e que ganhou proporções claras em Espanha, Portugal e Brasil, onde foram construídos templos sob a sua invocação.
A História do Templo em Esmoriz
O templo de Nossa Senhora da Penha de Esmoriz remonta ao século XVII. Começou por ser uma pequena ermida. O escritor antigo Rodrigo da Cunha diz que a sua criação é de 1623, mas o primeiro registo oficial é de 1639.
É curioso constatar que a fundação da ermida acontece no tempo da União Ibérica dos Filipes de Espanha (1580-1640) que dominavam em Portugal. O culto é de origem espanhola (Penha de França era uma serra da província de Salamanca) como foi indicado anteriormente e pode ter sido neste contexto sem fronteiras que o culto se tivesse propagado com maior facilidade no nosso país.
Em breve, a ermida se tornaria numa capela. Na entrada, encontramos a referência em latim “IOANES PINIA BAS:FECIT ANO 1345”, ou seja, o abade João de Pinho a construiu no ano de 1345. No entanto, o ano que foi gravado é um equívoco do artista que antigamente o lavrou sob pedra. Em vez de 1345, deveria aparecer 1645 que é, na verdade, a data em que a ermida desaparece para dar espaço a uma nova capela que a irá substituir. O Padre Aires de Amorim explica bem esse erro e corrige-o na sua monografia.
O abade João de Pinho liderou a paróquia de Esmoriz entre 1637 e 1666. Foi um homem dinâmico que tinha ainda algumas ligações ao cabido do Porto.
Decorreriam reformas estruturais nos séculos XVII e XVIII. A Capela terá sido demolida ou, pelo menos, reconstruída no século XVIII, tendo sido aproveitados os materiais da capela velha. O investimento foi de 355 mil reis. Em 1751, nasce um novo coro pelo valor de 24 mil reis. Em meados do século XIX, isto por volta de 1854, a capela irá dispor da sua torre. Em 1872, terá sinos novos. Entre os anos de 1890-1891, procedeu-se ao douramento do altar. Na altura, tudo isto justificou um investimento de 462 mil reis.
Chegou a haver uma festa na primeira e segunda oitavas do Pentecostes. Havia música, arraiais populares, eram lançados morteiros, haviam missas, desfiles embora mais modestos de andores. A festa em honra de Nossa Senhora da Penha está pelo menos documentada entre 1740 e a década de 1850.
Os melhoramentos prosseguiram nos séculos XX e XXI. No ano de 1923, dá-se uma nova reforma estrutural do templo, algo que custará 1900 réis. Nesse mesmo ano, adquire-se uma nova imagem da Nossa Senhora junto da entidade “Arte Cristã” localizada no Porto. Custou 800 réis. Restaurou-se ainda a imagem de São José. Estas duas acções muito se deveram a comissões constituídas por senhoras, então crentes, dos lugares da Boavista e da Aldeia. No ano de 1962, temos um novo restauro e douramento. É nesta altura que se constrói a sacristia do sul e a galilé da entrada. Muito destes méritos se devem ao padre José Rocha que dinamizou o templo. Por volta de 2004, houve ainda intervenções mais recentes ao nível das pinturas e dos seus restauros, sendo aqui de realçar o trabalho fantástico do pintor Paulo Fernandes. Ele retocou várias imagens ou pinturas murais do templo. Este artista elaborou ainda uma tela representando o Sr. Padre Fernando Campos junto à Capela da Penha restaurada.
Altar e Santos da Capela
O Altar é de talha dourada, e insere-se no âmbito do Neo-Barroco (corrente posterior que imitou o Barroco). A opulência e a elegância dos ornamentos chamam a atenção de qualquer visitante ou crente. Anjos e querubins cantam a magnificência do templo.
Ao nível dos santos, encontramos:
No Centro do Altar – A padroeira da Capela: Nossa Senhora da Penha (imagem do ano de 1923)
Nichos Laterais do Altar – As imagens de São José e de São João Baptista (ambas datadas do século XVIII)
No corpo da capela – Anjo da Guarda, São João Bosco, Imaculada Conceição e Menino Jesus
Pinturas murais: Anjos diversos, e na abóbada (tecto do templo), observamos as imagens da Anunciação do Anjo Gabriel a Maria, da Concepção (Presença de Deus sob a forma humana com um globo na mão, São José com o cajado e Nossa Senhora num plano central, e com a presença da pomba que simboliza o Espírito Santo) e da Ascensão de Nossa Senhora aos Céus.
É de referir também a presença de pequenas telas que remetem para os 14 passos da Via Sacra – uma oferta de Manuel Alves da Rocha em 1962.
Largo da Capela
A capela é cercada por um rossio, onde encontramos agora duas palmeiras gigantes a ladear o templo. Também detectamos sobreiros, carvalhos, plátanos, um castanheiro, uma oliveira e um cipreste. De acordo com o Padre Aires de Amorim, na sua obra “Esmoriz e a sua História”, “era ali no largo da Senhora da Penha, onde aos domingos à tarde se reuniam as famílias a passar umas horas à sombra dos velhos sobreiros que então ali existiam e aonde a mocidade se divertia”. Também lemos um testemunho do poeta e historiador António Maria que, tal como Aires de Amorim, era natural do Lugar da Boavista, e que nos remetia para a envolvência social que ali havia noutros tempos.
A Capela de Nossa Senhora da Penha de França é um dos mais belos templos do distrito de Aveiro, e um dos mais antigos do concelho de Ovar. E tal se deve muito aos fiéis que, durante os últimos 4 séculos, ofereceram donativos ou prestaram auxílio directo para que o templo tivesse chegado aos nossos dias em boas condições.
Créditos da Imagem de Destaque: Tâmara Junior
Nota-Adicional: A pandemia da COVID-19 interrompeu este ciclo de visitas guiadas, no entanto, e logo que a conjuntura favoreça, é possível que venham a ser reatadas ou que se proceda a reportagens similares, embora não possamos ainda nos comprometer com uma data.