Comité dos Direitos da Criança da ONU publica primeira orientação sobre os direitos das crianças e o ambiente, com foco nas alterações climáticas

29 de Agosto, 2023 0 Por A Voz de Esmoriz

O Comité dos Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (ONU) publicou hoje uma orientação oficial aos Estados sobre o que devem fazer para respeitar o direito das crianças a um ambiente limpo, saudável e sustentável. Face ao agravamento da crise climática, o Comité especificou as obrigações ao abrigo da Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU, ratificada por 196 estados, incluindo Portugal.

Esta Convenção de 1989, define os direitos universais das crianças, tais como o direito à vida, à sobrevivência e ao desenvolvimento e o direito à saúde. Os Comentários Gerais fornecem orientação jurídica sobre o que estes direitos implicam para um tema ou área específica de legislação. O agora publicado “Comentário Geral n.º 26 sobre os direitos das crianças e o ambiente, com foco especial nas alterações climáticas”, aborda explicitamente os impactos da emergência climática, do colapso da biodiversidade e da poluição generalizada, delineando medidas de contrapartida para proteger as vidas e as perspetivas de vida das crianças, reforçando o princípio da equidade intergeracional e das gerações futuras.

O Comentário Geral n.º 26 reconhece que a concretização dos direitos da criança é indissociável do ambiente em que vivem, dado que o desenvolvimento integral da criança só pode ocorrer num ambiente limpo, saudável e sustentável. Para tal, é basilar garantir o acesso a uma habitação adequada (resiliente); a segurança alimentar e a segurança de todas as crianças, de modo a reduzir as vulnerabilidades criadas pelos fenómenos naturais como os eventos climáticos extremos, a degradação ambiental ou a perda da biodiversidade.

A crise climática está a acontecer já hoje e tem consequências graves para a saúde e o bem-estar das crianças. De acordo com os dados mais recentes da UNICEF[i]:

Cerca de mil milhões de crianças – quase metade das crianças do mundo – vivem em países de risco extremamente elevado perante os impactos das alterações climáticas;
Mais de 99% das crianças de todo o mundo estão atualmente expostas a pelo menos um destes perigos climáticos: pressões climáticas e ambientais, como a escassez de água, inundações, exposição a doenças e poluição atmosférica;
Atualmente, 2 mil milhões de pessoas vivem sem acesso a água potável, das quais 600 milhões são crianças;
Até 2040, prevê-se que quase 600 milhões de crianças vivam em zonas de stress hídrico extremamente elevado – uma em cada quatro crianças com menos de 18 anos.

Beatriz Imperatori, Diretora Executiva da UNICEF Portugal, afirma: “A crise climática é uma crise dos direitos da criança e de desigualdades. As crianças são as menos responsáveis por este problema, mas as mais afetadas pelas suas consequências. Em Portugal, uma em cada quatro crianças é afetada pela seca severa e extrema que o país enfrenta[ii]. É da responsabilidade do Estado Português garantir o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado para todas as crianças que vivem no nosso país, aliás conforme reconhecido na Constituição da República Portuguesa no seu artigo 66.º, não esquecendo a sua responsabilidade na proteção do ambiente a nível global do planeta, especialmente cuidando das crianças mais vulneráveis. Hoje apelamos aos decisores políticos, ao setor público, a todas as empresas e instituições e à sociedade civil que coloquem as crianças em foco nas estratégias para o ambiente e que as capacitem enquanto agentes de mudança. É preciso mudar em tempo útil”.

Os 196 Estados que ratificaram a Convenção sobre os Direitos da Criança são incentivados a tomar medidas imediatas, incluindo a eliminação progressiva do carvão, do petróleo e do gás natural e a mudança para fontes de energia renováveis, melhoria da qualidade do ar e garantia do acesso a água potável, transformação da agricultura industrial e das pescas para a produção de alimentos saudáveis e sustentáveis e a proteção da biodiversidade.

O Comentário Geral n.º 26 ajuda a interpretar o compromisso dos Estados, no âmbito do Acordo de Paris, de respeitar, promover e considerar as suas obrigações em matéria de direitos da criança quando tomam medidas para endereçar as alterações climáticas. Também deixa claro que devem ser realizadas avaliações do impacto sobre os direitos da criança para toda a legislação, políticas e projetos, regulamentos, orçamentos ou outras decisões relacionadas com o ambiente. Os Estados terão de apresentar periodicamente ao Comité da ONU relatórios sobre os progressos realizados na proteção dos direitos ambientais das crianças.

Philip Jaffé, membro do Comité das Nações Unidas para os Direitos da Criança, afirma: “As crianças em todo o mundo têm liderado a luta contra as alterações climáticas, apelando aos seus governos e empresas para agirem de forma a proteger o planeta e o seu futuro. Com o Comentário Geral n.º 26, o Comité dos Direitos da Criança não apenas amplifica as vozes das crianças, mas também define claramente os seus direitos em relação ao meio ambiente que os Estados membros devem respeitar, proteger e cumprir… coletiva e urgentemente!”

O documento especifica, ainda, que os Estados são responsáveis não só por proteger os direitos das crianças contra danos imediatos, como também por violações previsíveis dos seus direitos no futuro devido a ações dos Estados – ou à sua omissão – no presente. Além disso, sublinha que os Estados podem ser responsabilizados não apenas por danos ambientais que ocorram dentro das suas fronteiras, mas também pelos impactos prejudiciais dos danos ambientais e das alterações climáticas para além das suas fronteiras. Deve ser dada atenção especial aos danos desproporcionais enfrentados pelas crianças em situações desfavorecidas.

Acerca da UNICEF

A UNICEF trabalha em alguns dos lugares mais difíceis do mundo para chegar às crianças mais desfavorecidas. Presentes em 190 países e territórios, trabalhamos para todas as crianças, em qualquer parte, para construirmos um mundo melhor para todos.

A UNICEF depende inteiramente de contribuições voluntárias, públicas e privadas.

Para saber mais sobre a UNICEF e o seu trabalho para as crianças, visite: www.unicef.pt

[1] Fonte: https://data.unicef.org/topic/climate-change/overview/#status

[1] Fonte: Cruzamento dos valores do PDSI Index, disponível na página online do IPMA (dados referentes a maio de 2023) com o número de crianças residentes no respetivo distrito (idades entre os 0 aos 19 anos), pelo total de crianças residentes em Portugal em 2022, extraído do Pordata.

Créditos da Imagem: UNICEF/BRZ/Raoni Libório