Mistério das cores dos papagaios é revelado em novo estudo liderado por cientistas portugueses
9 de Novembro, 2024Do Carnaval no Rio de Janeiro aos ombros de piratas: os papagaios são sinónimo de cor para pessoas em todo o mundo. Num novo estudo publicado na revista Science, uma equipa internacional liderada por cientistas portugueses do BIOPOLIS-CIBIO e da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) revela pela primeira vez como um único gene permite aos papagaios controlarem a sua grande diversidade de cores.
«Os papagaios ‘pintam’ as suas penas de uma forma única», começa Roberto Arbore do BIOPOLIS-CIBIO e co-primeiro autor do estudo. Embora muitas aves tenham penas amarelas e vermelhas, os papagaios fazem-no com recurso a pigmentos únicos, chamados psitacofulvinas (do grego antigo “psittakós” para papagaio, e do latim “fulvus” para amarelo-avermelhado). «Estas aves combinam estes e outros pigmentos para criar cores brilhantes como amarelos, vermelhos e verdes, tornando-os dos animais mais coloridos na natureza», menciona Roberto Arbore.
Os papagaios são criados como animais de companhia em milhões de lares pelo mundo inteiro, apreciados pela sua cor e inteligência. Mas apesar desta visibilidade, os cientistas desconheciam ainda como esta grande palete de cores era criada. «Isto é um grande mistério tanto para cientistas como para amantes de aves», explica Miguel Carneiro, do BIOPOLIS-CIBIO e coordenador do estudo, que acrescenta: «e isto é importante para uma questão central na biologia, nomeadamente como é que a diversidade surge na natureza?».
Para responder a esta questão fundamental, os cientistas demonstraram primeiro que, em diferentes espécies de papagaios, as cores amarela e vermelha eram sempre geradas por dois tipos de pigmentos únicos entre as aves. De seguida, focaram-se numa espécie na qual indivíduos amarelos e vermelhos coexistem na natureza, algo que é muito raro. «Apesar de o lóri-sombrio ser nativo das florestas da Papua Nova Guiné, tivemos ajuda de criadores de aves certificados em Portugal para estudar a genética desta espécie», afirma Pedro Miguel Araújo, investigador da FCTUC, que coliderou o estudo, reforçando a participação crucial de cidadãos não-cientistas na elaboração do estudo.
Os cientistas descobriram que uma proteína apenas é responsável pelas diferenças de cor nestes lóris, um tipo de aldeído desidrogenase (ALDH), “ferramentas” essenciais para a destoxificação em organismos complexos – por exemplo, contribuem para eliminar o álcool do fígado em humanos. Soraia Barbosa, também coprimeira autora do BIOPOLIS-CIBIO, explica: «as penas dos papagaios como que ‘pedem’ esta proteína ‘emprestada’, usando-a para transformar psitacofulvinas vermelhas em amarelas». De acordo com a cientista, «este mecanismo funciona como um regulador de luz ao contrário, no sentido em que maior atividade desta proteína resulta numa cor vermelha menos intensa».
Para demonstrar este mecanismo simples, a equipa voltou-se para um papagaio mais familiar, o periquito-amarelo, para explorar como é que as células das penas, de forma individual, ligam ou desligam genes diferentes durante a formação de cada pena – algo nunca antes feito a nível mundial – o que lhes permitiu concluir que um conjunto reduzido de células é responsável por toda a mudança de cor nas penas. Como validação final, os cientistas criaram leveduras geneticamente modificadas com este gene das cores dos papagaios: «incrivelmente, as nossas leveduras modificadas começaram a produzir cores de papagaio, o que demonstra que este gene é suficiente para explicar a forma como os papagaios controlam a quantidade de amarelo e vermelho nas suas penas».
Este estudo demonstra como as novas tecnologias de ponta na biotecnologia estão a ser cada vez mais usadas para desvendar os mistérios da natureza. «Agora temos uma melhor compreensão em como estas cores incríveis evoluem em animais selvagens através de um simples mecanismo de regulação que utiliza uma proteína de desintoxicação para servir um novo propósito», concluem.
Estas descobertas ajudam os cientistas a pintar uma nova e colorida imagem da evolução das espécies como um processo no qual a complexidade pode ser alcançada através de simples inovações.
Universidade de Coimbra
Texto enviado pela Agência Portuguesa de Imprensa