O Ti’Telmo, entre o labor da Arte Xávega e a Poesia Popular

1 de Novembro, 2020 Não Por A Voz de Esmoriz

O Ti’Telmo, mais conhecido por Telmo Pinho Grosso, foi um dos verdadeiros lobos do mar, o barqueiro exímio da Arte Xávega de Esmoriz. Infelizmente, já cá não está entre nós, mas o seu legado permanece nas memórias descritivas de todos os vareiros desta região.

Graças a ele e a vários pescadores da nossa terra, seriam servidas nas mesas de várias casas e restaurantes as melhores sardinhas, carapaus, robalos, solhas, peixes-aranhas, cavalas, etc.

Sabemos ainda que escreveu alguns versos que integraram os seus poemas e fados. Demonstrava uma elevada sensibilidade e um espírito genuíno, expressando as suas alegrias e inquietudes de cada momento ou fase da sua vida.

A vida de Telmo Pinho Grosso foi um exemplo para a etnografia esmorizense, pescador e poeta, defensor das tradições e valores do seu torrão natal. Também adorava, como poucos, o nosso fado, uma das grandes expressões nacionais.

Deixamos, por fim, um poema seu que reflecte as aflições vividas em alto mar, quando se procurava garantir o sustento da comunidade diante de ondas e correntes terríveis, e em alturas, em que só a intercessão divina era a derradeira esperança para abençoar a coragem destes homens que ajudaram a erguer uma terra durante décadas, honrando uma tradição de séculos!

Refira-se que Telmo Pinho Grosso fez chegar uma pequena compilação de poemas seus que viriam a ser apreciados na Assembleia da República, quando se abordavam os temas da pesca e da Arte Xávega.


O MAR

(Poema da autoria de Ti’Telmo)


Pescador, velho lobo do mar

Que pedes para te levar

Com saudades de te ver

Porque não te posso esquecer

No tempo que eu andava

Em cima de ti navegando

Trabalhando e chorando

E te pedia por amor

Ó mar não sejas traidor!

O céu azul revoltado

Enraivecido pelo vendaval

O tempo não pode acalmar.

O que fazes lobo do mar?

Ó Deus peço-vos rezando

Que o tempo vá acalmando

E que o céu fique claro

Para eu poder navegar

Que eu não posso mais chorar

Ó mar não sejas traidor!

Já não vejo espuma branca

Das tuas enormes vagas

Já tenho as velas rotas

Já não tenho forças nos braços

E não vejo o tempo de abrandar

Ó Deus, como hei-de passar?

Os mastros já caíram ao mar

Está-se tudo a despedaçar

E eu ficarei sem vida

Ó mar não sejas traidor!

Agora navegamos devagar

Sem nada poder arranjar

Com tudo desmantelado

E tudo esfarrapado

E o barco moribundo

São medalhas deste mundo

Que nós podemos ganhar

Enquanto não há calmaria

É trabalhar de noite e de dia

Ó mar não sejas traidor!


Retrato de Telmo Pinho Grosso (“Ti’Telmo”) e uma dedicatória do seu amigo José Ribeiro. Agradecemos à Associação de Amigos da Praia Velha pela cedência da informação