Porto Rico: entre a recessão e o “sonho americano”

9 de Novembro, 2020 0 Por A Voz de Esmoriz

Porto Rico é hoje um arquipélago situado nas Grandes Antilhas, o qual inclui não só a ilha principal (que dá nome ao território), mas ainda uma série de ilhas mais pequenas como Mona, Culebra e Vieques. Esta nação conta com mais de 3 milhões de habitantes, e conhece como idiomas oficiais o espanhol (utilizado mais fluentemente) e o inglês.

Actualmente, é um estado livre embora associado aos EUA. Os cidadãos de Porto Rico detêm passaporte norte-americano e usufruem de muitos dos direitos atribuídos naquele país, contudo não podem votar e participar nas eleições presidenciais para a Casa Branca. Por outras palavras, os habitantes do arquipélago apenas votam para escolher o seu governador e definir a sua constituição insular.

Muitos turistas procuram Porto Rico porque ali encontram um clima verdadeiramente tropical, sem olvidar as suas paisagens naturais únicas, nomeadamente as suas praias exóticas. O país é igualmente cobiçado pela sua cozinha tradicional, pelas danças e músicas (de influência indígena), pelas suas construções históricas e ainda pelos incentivos fiscais apelativos.


Porto Rico (ou Puerto Rico) é um dos arquipélagos das Antilhas, sendo banhado pelo Mar das Caraíbas. Podemos observá-lo a este da República Dominicana.
Mapa retirado de: Pinterest (publicado na plataforma por Toñi R.)


Um pouco de História

O início do povoamento do arquipélago de Porto Rico terá acontecido algures no período cronológico situado entre 3 mil a 2 mil a. C.

Proveniente da América do Sul, povo Ortoroide seria o primeiro grupo de humanos a chegar às Antilhas, tendo ocupado várias ilhas. Sabemos que viveram da pesca e sobretudo da captura do marisco.

No entanto, outras comunidades indígenas se aventurariam no Mar das Caraíbas, acabando com a hegemonia daquele povo mais primitivo. Aquando da chegada de Cristóvão Colombo às Antilhas em 1492 (embora só tenha chegado a Porto Rico no ano seguinte, já numa segunda viagem), o povo taíno era quem já se evidenciava no território insular. Liderados por poderosos caciques, os taínos viviam da pesca, da caça (munindo-se de arcos e flechas) e de algumas práticas agrícolas. Já fabricavam canoas de diferentes tamanhos e, no século XV, já tinham assentos populacionais com mais de três mil pessoas.

No entanto, a chegada dos espanhóis significou o fim da sua era. As guerras, a escravização e as doenças (sobretudo o caso da varíola) transportadas pelos novos colonizadores dizimaram mais de 90% dos taínos.

Durante cerca de quatro séculos (1493-1898), Porto Rico foi uma colónia de Espanha e teve o seu próprio governador destacado pela metrópole. O sistema de “encomiendas” (exploração económica dos recursos agrícolas e de metais preciosos, tendo por base a utilização, muitas vezes forçada, de mão de obra indígena) e a sua localização estratégica para fins comerciais ou de transporte foram factores que suscitaram o interesse dos reis espanhóis, apesar de existirem ilhas com maior potencial nas Antilhas (casos de Cuba, Guadalupe ou São Domingos).

Em 1898, durante a Guerra Hispano-Americana, Porto Rico foi invadido pelos norte-americanos e os espanhóis acabaram por ceder o arquipélago aos Estados Unidos da América.

Durante os primeiros tempos desta nova era, pouco haveria de mudar: Porto Rico continuou a ser uma espécie de colónia, embora agora sob a supervisão de uma nova metrópole.

Ainda assim, e após vários avanços e recuos, os porto-riquenhos começaram a conquistar alguns direitos, sobretudo já no decurso do século XX. Em 1917, o Congresso dos EUA concedeu aos porto-riquenhos a cidadania americana, em 1947, este povo ganhou o direito de eleger o seu próprio governador, e entre 1950-1952, puderam definir a sua própria constituição, o que lhes granjeou alguma autonomia, embora sem comprometer a sua dependência face ao Congresso Norte-Americano que continua a ter hoje um peso importante nas decisões vitais de Porto Rico, o qual ostenta o estatuto de “Estado Livre Associado”.

Ainda assim, houve igualmente movimentos e iniciativas independentistas que culminaram inclusivamente em tumultos e actos de violência, cuja expressão foi bastante visível, por exemplo, durante a década de 50.

Todavia, nos últimos anos, as reivindicações de uma independência total de Porto Rico perderam alguma notoriedade, e o país admite, neste momento, um dos próximos dois cenários: manter-se como Estado Livre Associado (com poder legislativo próprio, mas regidos em última instância pelo Congresso dos EUA) ou tornar-se oficialmente no 51º Estado Norte-Americano.


Vários porto-riquenhos defendem a adesão total de Porto Rico aos EUA, acreditando que tal poderá trazer progresso e melhores condições sociais.
Direitos da Foto: Thais Llorca/EPA
Além dos defensores da adesão oficial aos EUA, também há cidadãos que defendem uma maior independência do país face a ingerências externas.
Direitos da Foto: Causa Operária.org

Recessão Económica e Nova Consulta Popular

Porto Rico tem hoje uma dívida impagável, e já foi considerado de forma satírica como a “Grécia das Antilhas” pela revista “The Economist”. Em 7 dos últimos 8 anos, o arquipélago apresentou resultados medíocres no plano financeiro. A taxa de desemprego rondava os 13% no ano de 2019, e a emigração de porto-riquenhos, detentores automáticos de passaporte norte-americano, tem vindo a acentuar-se. Cerca de 280 mil pessoas deixaram Porto Rico na última década, o que representa 7% da população.

Em 2019, a dívida de Porto Rico cifrava-se nos 72 bilhões de dólares, maior do que quase todos os estados americanos, com excepção da Califórnia e de Nova Iorque (embora estes tenham receitas muito superiores), e que corresponde a 104% do PIB.

A crise levou ao êxodo de muitos jovens, várias empresas deixaram a ilha, há menos gente a consumir e a pagar impostos, factores que acentuam o declínio financeiro.

45% da população vive na pobreza, e Porto Rico não pode declarar falência visto que não é (ainda) um Estado Americano, pelo que não pode obter um apoio financeiro que permita a restruturação da sua economia e regularização das dívidas das suas instituições públicas perante os credores. O governo porto-riquenho tem enveredado pela via impopular da austeridade e do corte na despesa, acabando por adensar os números da emigração.

Porto Rico foi também vítima dos investidores, maioritariamente norte-americanos, que, aproveitando que a ilha e suas entidades públicas estão proibidas por lei de entrar em default, continuaram a comprar obrigações sem se preocuparem com a situação financeira do território, agravando o status quo.

Factores externos como crises económicas mundiais e o furacão “Maria” (em 2017, causou enormes estragos e provocou mais de 3 mil mortes no arquipélago de Porto Rico) também não ajudam a que o território se possa reerguer.

Multidões têm saído às ruas da capital San Juan, protestando contra a austeridade e a ausência de transparência política. Um dos alvos, é o seu Governador Ricardo Rosselló, eleito em 2016, o qual foi apanhado em conversas bastante controversas, em que desrespeitava os seus opositores políticos e contava piadas de mau gosto sobre as vítimas do furacão Maria. Refira-se ainda que Rosselló é um dos rostos que defende a anexação de Porto Rico aos EUA.


Ruidosa manifestação em 2019 contra o Governador de Porto Rico – Ricardo Rosselló.
Direitos da Foto: Christopher Gregory/TIME

Atendendo a este contexto e à necessidade de esclarecer o estatuto de Porto Rico, decorreu mais uma consulta popular (historicamente, foi a sexta!) em inícios de Novembro (2020) e de acordo com a Comissão Estatal de Eleições (CEE), 52,34% dos votos verificados seriam a favor da adesão aos Estados Unidos da América enquanto 47,66% dos participantes se revelaram contra essa eventualidade. Desconhece-se se este resultado será determinante para o futuro do arquipélago pelo que o mesmo depende da vontade e de potenciais futuras negociações entre as altas instâncias porto-riquenhas e norte-americanas.


O povo porto-riquenho participou na mais recente consulta popular.
Direitos: Thais Llorca/EPA

Um Arquipélago com potencial turístico

Apesar da gravíssima situação económica e da turbulência política e social, Porto Rico tem um considerável potencial turístico tal como outros arquipélagos banhados pelo Mar das Caraíbas. É o caso da Praia Flamenco, situada na ilha de Culebra, onde as areias combinam na perfeição com a vegetação envolvente.

Na ilha principal de San Juan, evidenciam-se grandes construções de interesse público, nomeadamente o Forte de San Felipe del Morro e o centro histórico composto por casas centenárias, ruas bucólicas e algumas áreas verdes.

A Floresta Nacional de El Yunque é outro cartão de visita para quem aprecia os recantos da natureza. A mesma é ainda pontuada por cascatas dignas de serem contempladas e trilhos que favorecem longas e saudáveis caminhadas.

A culinária é igualmente uma das mais procuradas no panorama mundial. Por exemplo, o tradicionalíssimo “arroz con gandules” é uma referência gastronómica que já conquistou imensos paladares.

Para efeitos de curiosidade, Ricky Martin (na música) e Joaquim Phoenix (no cinema) são porto-riquenhos famosos no panorama mundial.

O Castelo ou Forte de San Felipe del Morro foi construído pelos colonizadores espanhóis no século XVI.
Direitos da Foto: Damien Kientz
Porto Rico pauta-se ainda pelos seus centros históricos (é o caso da capital San Juan).
Direitos da Foto: Dominique Garner
A Praia Flamenco situada na ilha de Culebra convida os viajantes a conviver com a paisagem exótica tropical.
Direitos: Discover Puerto Rico.com

Principais Fontes: CNN, NBC News, Agência Brasil, Diário de Notícias, Observador, Revista The Economist, Extra Globo, EFE, Revista Time.

Foto de Destaque da Reportagem (na capa): Uma manifestação em San Juan, capital de Porto Rico. Créditos: Alejandro Granadillo, Getty Images.